terça-feira, 17 de dezembro de 2024

Tudo aqui é antigo II

Tudo aqui é antigo

O corpo de Hart Crane se dissolvendo no mar

E as luzes dos vaga-lumes no cio

Os beija-flores que entram pela janela

O choro dos bebês

A sede e a fome de mistério

Tudo aqui é antigo

Os vitrais que sobreviveram aos terremotos

As pílulas que o andarilho leva ao bolso

E o mormaço que acompanha nossos passos

Tudo aqui é antigo

As velas que nossas mãos trêmulas insistem em acender

A procissão de eguns que dançam em torno à árvore de nossas mirações

E a insônia que nos protege de nossos próprios espantos

Tudo aqui é antigo

Como o vento dos mitos mais antigos

Como a tempestade que aguarda a hora de desabar sobre nossas cabeças

Como os cabelos de Andrômeda, a princesa etíope

Tudo aqui é antigo

Tudo aqui é memória de um coração forasteiro

Tudo aqui é marulho e arrebentação

Como o fogo que em cinza transmuta todas as coisas 

Tudo aqui é antigo movimento de um velho ferrorama

Vagando perpetuamente do Nada ao Nada

Até que nos trilhos não haja memória alguma das ruínas do mar

Nem dos ossos das tempestades


nuno g.

Toróró, 18 de dezembro de 2024. 

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