sexta-feira, 22 de setembro de 2023

A poesia, o rio, as onças e o caminho

todas as águas fora do leito

e esse insistente rogar de passagem

como salamandras ardendo no fogo

ou esse contínuo sonhar que nos conduz

como cegos ao palácio dos beija-flores

e esses cães guardando o tempo

todas as areia se movendo em círculos

como se não houvesse mais centro

ou essa noite estendida sobre a umidade das ervas

e esse insistente perfume do ventre

todas as águas nessa água que brota

e esse insistente rogar por um chão

como se houvesse qualquer fronteira possível

entre a loucura e a nitidez

entre o real e o mais-real

entre o que se diz e o que se escuta

entre o que se assenta e o que se faz aéreo de todo

e esses cães guardando o tempo

e esses cães guardando o Nada

e esses cães nos guardando de nós mesmos

do que somos / do que nos aguarda / de tudo ao qual dissemos não

e esse insistente rogar rompendo o silêncio

servindo à mesa nossos medos imaginários

extraídos à fórceps de um antigo dicionário

labirinto de rupestres inscrições gravadas no seio fértil da memória...


nuno g.

Toróró, 22 de setembro de 2023.

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