domingo, 25 de setembro de 2022

cemitério indígena.

era uma vez.

ossos & penas debulhados.

entre grãos de nada.

e camadas e camadas de esquecimento.

era uma vez.

um chão onde antes dançavam os tapuias.

onde antes se fartavam de alegria corpos e corações.

era uma vez uma menina.

com um matulão de sonhos.

e um candeeiro de larva vulcânica.

era uma vez a morte.

e a chegada dos nossos.

com suas armas e sua ignorância.

e seu deus esfomeado de ouro e prata.

era uma vez um futuro.

ossos & penas debulhados.

entre grãos de nada e eternidade.

entre chispas de fogo fátuo e desmemoria.

onde não dançavam corpos tristes e corações vazios.

era uma vez um recém-renascido.

andando entre arranha-céus e um deslumbrante céu sem nuvens.

banhando-se num rio de águas antigas.

ouvindo onças imortais.

embalando-se nas redes de Tempo.

entre-nuvens. entre-árvores. entre forasteiros-familiares.

era uma vez um sonho.

entre pontes e fragrâncias.

com uma saudade do mar: verde e absoluto.

era uma vez cães que latiam e latiam sem parar.

ossos & penas debulhados num chão indígena.

e uma leve esperança nas mãos que guiam a passagem.

era uma vez um guerreiro que guerreava com delicadeza e suavidade.

era uma vez um fogo inextinguível.

era uma vez

era uma vez

era uma vez...


nuno g.

Toróró, 25/09/22.

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