para Maria Zilá Lima Gonçalves
minhas mãos
trêmulas desde antes da criação do mundo
úmidas como úmida a madrugada de minha infância
te ofertam essas duas flores encarnadas como carvão em brasa
minhas mãos
unhas sempre ruídas
palmas riscadas por pequenos relâmpagos
te apresentam essas duas flores que a seu pedido foram nomeadas marias
minhas filhas
seus nomes são memória de que a carne é estremecimento e devoção
seus nomes são memória de que ainda em sonhos sua bisavó seguia em oração
seus nomes são memória que uma serpente rasteja ainda no chão de meu coração
minha vó
o caminho da novena era mais estreito e comprido que eu imaginava
o caminho da novena era mais cheio de curvas e insensatezes que meus delírios
o caminho da novena, minha eterna febre enlaçada em suas rugosas mãos de serenidade
a paz está sempre em algum lugar onde nunca se chega
a paz está sempre fora do alcance das mãos
a paz é um pássaro do passado que os ornitólogos nomearam amanhã
nuno g.
Toróró, 17 de março de 2023.
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