quarta-feira, 9 de outubro de 2024

diga a eles que não me matem

É um bocado difícil crescer sabendo 
que a coisa a que podemos agarrar-nos para criar raízes está morta.

Juan Rulfo


Meu pai não se chamava Guadalupe Terreros.

Mas quando cresci e o procurei me disseram que, como ele, estava morto.

Irremediavelmente morto.

Foi como ouvir alguma música para ouvidos nada delicados.

Ainda assim meus tímpanos estouraram.

Foi como se num átimo de segundo mergulhassem meu corpo nas fossas marianas.

Ou na dorsal atlântica.

A terra devastada pela chamas e o meu corpo carbonizado junto.

Num átimo de segundo arrastado à sepultura de águas oceânicas.


(os azulejos azuis eram os únicos peixes possíveis)

(e o único pássaro que conseguia seguir a cantar era o Assum Preto)

(cego pela ignorância e pela maldade humana)


Meu pai não se chamava Guadalupe Terreros.

Mas os homens que o mataram sabiam que trazíamos o mesmo nome de pia.


nuno g.

Toróró, 09/10/24.




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