quinta-feira, 23 de novembro de 2023

Atabaques.

Tardei, mas.

Me vieram as forças e a permissão de roçar as asas daquela noite.

A mulher ao meu lado razão e leite e perfume de.

Paisagem da janela na voz do Caçador de Si.

Todos os fogos explodindo à beira do rio que é todos os rios.

23 de novembro - nunca mais um dia qualquer.

Azia. Serenidade. Clamor de chuva.

Adélia, Hermenegildo e o inventário das coisas que sabem a pássaros.

Sobre sementes e árvores e baús onde se guardam artefatos explosivos.

Tardei, mas.

Eles eram muito mais antigos do que tudo o que até então chamei de antigo.

Eram arcaicos e enigmáticos.

Tremiam. Abraçavam com muita força. E nos fizeram leves.

Nos ensinaram o necessário.

Se desfazer das folhas, se desfazer das penas, se desfazer das máculas.

Tardei, mas.

Voltei a sentir o fio de prata me atar à terra.

De tão terra que eram soavam como nuvens.

Traziam a morte e a vida dentro. Traziam o Silêncio.

O Impronunciável.

Corpos-montanhas.

Já faz tempo, mas não esqueço.

Estão nessa razão e nesse leite da mulher que ao sofá amamenta agora.

Estão nessas árvores que crescem.

Estão em tudo que recorda esse 23 de novembro.

E dessa paisagem da janela aberta pela voz da onça verdadeira os vejo.

Os sinto. Os reverencio.

E a Eles rogo: razão, leite e afeto sem máculas.

Tardei, mas.

Voltei a sentir o fio de prata que me ata à terra.

E agora posso roçar de leve o que ocorreu naquela noite.

E, finalmente, ouvir a voz poderosa e sedutora da morte.


nuno g.

Toróró, 23 de novembro de 2023.

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