O Velho veio em sua forma de pássaro.
As lavras das mangabeiras pelas mesmas mãos que chamavam a Serpente.
Toda uma vida talvez não seja suficiente para regressar à casa onde se nasce.
A igrejinha de Nossa Senhora da Conceição perdida entre as voçorocas de um sonho.
O Velho veio em sua forma de pássaro.
Todas as passagens fechadas.
Os pescadores em volta do fogo cultuando o Velho.
A Senhora das Sementes cultuando a Senhora das Serpentes.
Toda uma vida talvez não seja suficiente.
Era o primeiro dia de agosto.
A dor no osso do joelho esquerdo do Ferreiro que fazia as joias.
Em sua casa de palha, numa capoeira no meio do verde da mata.
Sozinho e em silêncio.
Trabalhando o ferro como quem ora.
O Velho veio em sua forma de pássaro.
Junto com ele a Senhora das Sementes.
Junto com ele a Senhora das Serpentes.
Junto com ele o Ferreiro das Doces Águas.
Junto com ele o Menino da Encruzilhada.
Licença - e meus olhos entraram na casa de palha.
Licença - e meus olhos cruzaram o verde da mata.
Licença - e meus olhos tocaram o roxo do vestido e se encharcaram de lama.
O Velho partiu e deixou seu canto de pássaro.
O osso em trauma e uma névoa nos pensamentos.
Na pedra do rio uma criança.
Na praia os pescadores repetindo:
somos parentes e temos toda a vida para regressarmos à casa
- mas talvez uma vida não seja suficiente.
nuno g.
Toróró, 03 de agosto de 2022.
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