barcos de ossos subindo o rio / homens com buracos no peito descendo a serra / onças indecifráveis e índios tapuias / batalhas, punhais de prata, crucifixos, traições, degredo e violação /
homens ébrios entoando belíssimas canções de guerra em volta do fogo / assando carne e comendo / quase crua: o sangue escorrendo no canto da boca / a lua clareando na serra / as caravanas de negros amordaçados e acorrentados arrastados pelo areal dos tabuleiros das terras altas do vale / os maturis florescendo /
os rebanhos de bois e moscas / as emboscadas, os estupros, a ilha encantada / a última peregrinação dos tapuias à nascente do jaguaribe no árido sertão dos inhamuns / os pássaros agourentos e premonitórios / os quarenta piratas holandeses e a tribo dos suicidas / a carroça de fogo / o velho com olhos de estrelas / o daimon do paredão de pedra / a fronteira de arame / os relâmpagos, os raios e o insondável trovão / o cheiro do cio das fêmeas /
os gigantescos tachos cozinhando o leite pra fazer doce / as prensas dia e noite sem parar produzindo queijo do leite coalhado / as cabras absortas de ares perdidos rezando e pastando no cascalho e no pedregulho onde nunca faz sombra /
o pó das palhas do carnaubal cegando os bárbaros invasores / os gaviões destilando o pesadelo gestado nos grotões da serra da baraúna / os alazões endemoninhados cruzando as águas ensanguentadas do velho rio / os rabequeiros alucinados com seus tropéis de versos agalopados e martelos enfeitiçados / cascavéis soando guizos e chocalhos malditos /
os oráculos de tripa de carneiro, os brasões ilegíveis, as cruzes de madeira assinalando os sítios das mortes de homens sem nome e sem historia / caiçaras e barreiros represando lágrimas salobras / peixes em forma de lâminas, tatus gigantescos / as várzeas da insônia / as orações dos pistoleiros de corpos fechados / os rosários bailando nos dedos trêmulos das beatas / a febre flechando o coração dos lunáticos /
as matilhas de gatos maracajás, a procissão dos fantasmas se arrastando hacia o inferno, o sol latejando como um ressentido e furioso dragão oriental, as frondosas oiticicas nas croas do rio abrigando seres fantásticos, a sinfonia dos pífanos do purgatório / o beijo doce da sedutora moça caetana /
as esporas reluzentes...
nuno g.
são bernardo das éguas russas, 01 de março de 2018.
O velho Jaguaribe. Navegaremos com a Edbarco.
ResponderExcluiruma grande abraço, amigo.